A tributação e as transferências fiscais na União Europeia

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O Tratado Europeu não prevê instrumentos de política macroeconómica de que resultem transferências fiscais automáticas (estabilizadores) com suficiente relevo entre países membros, apesar de se saber, muito antes da criação da moeda única, que é necessário que existam transferências fiscais significativas em Uniões Económicas e Monetárias (i.e., países com moeda única). O orçamento comunitário representa cerca de 1% do PIB da União Europeia.

O recente caso da Apple mostra que, a acrescer ao problema da ausência de transferências fiscais automáticas significativas entre países membros, o enquadramento tributário na União Europeia permite que uma empresa sediada num país membro possa realizar vendas num outro país membro sem que esteja obrigada a pagar impostos sobre os lucros dessas vendas nesse país.

A nível nacional é compreensível e defensável que uma empresa que realize vendas em todo o país pague os impostos sobre lucros, por exemplo, em Lisboa, onde está localizada a sua sede, porque é complexo e de elevado custo o cálculo e a apresentação dos lucros obtidos dos lucros obtidos em cada região. Da mesma forma que, por exemplo, um residente em Coimbra que trabalhe em Lisboa, pague o seu imposto sobre o rendimento singular (IRS) em Coimbra e não em Lisboa. Isto porque o Estado português tem uma função redistributiva importante, realizando transferências fiscais significativas no país (ainda que de forma imperfeita).

Como não existem transferências fiscais significativas entre países membros, então o princípio da fiscalidade que se aplica a nível nacional não deveria ser utilizado a nível europeu.

Assim, afigura-se que a actividade económica deveria pagar impostos sobre os seus “lucros” no espaço económico onde esses lucros são gerados. Ou seja, a Apple e outras companhias multinacionais a operar em Portugal deveriam passar a pagar impostos sobre os lucros obtidos na actividade económica que realizam em Portugal, mesmo que não tenham um estabelecimento estável (já o fazem quando possuem um estabelecimento estável em Portugal) não sendo aceitável que paguem esses impostos no país da UE em que têm a sua sede.

O mesmo princípio se deveria aplicar ao imposto sobre rendimento singular, que deveria ser tributado de acordo com o país onde o rendimento foi gerado.

Ou seja, não havendo (nem sendo previsível) um orçamento europeu que permita ou contemple transferências fiscais significativas entre países, torna-se necessário, em meu entender, alterar os princípios que regem a tributação na União Europeia.

Ricardo Cabral