Esqueçam-se os argumentos técnicos. As sanções são uma decisão política.
Há menos de um mês, num artigo sobre o Brexit, escrevi que não acreditava que as sanções a aplicar a Portugal e Espanha fossem as que se falavam: corte de fundos estruturais. O momento histórico, o facto de ter havido mais de cem incumprimentos ao longo dos últimos anos ou de Alemanha e França também terem fechado as suas contas com incumprimentos levavam-me a acreditar que o receio do ridículo prevaleceria sobre a vontade de chicotear. Estava errado. A Comissão Europeia decidiu propor a suspensão de 60 e 16 fundos estruturais para Espanha e Portugal, respetivamente.
Ainda que o processo não esteja fechado e possa vir a arrastar-se ao longo de meses e nos tribunais, ele é revelador da forma como quem dirige a UE olha para os dois países. Se em Espanha os aborrecem os atrasos na indigitação do governo de Rajoy, em Portugal irrita-os que esteja em funções um governo que não pede desculpas antes de se sentar à mesa dos conselhos.
No que diz respeito à questão portuguesa, a decisão assume contornos de escândalo quando se percebe que a análise recai sobre as contas da governação anterior, que aplicou a receita de Bruxelas e que, até há uns meses, era apresentada como o bom exemplo. Fica claro que o “bom exemplo” era o governo, não os seus resultados, e que, tal como Maria Luís Albuquerque declarou, não haveria sanções se se mantivesse em funções.
Esqueçam-se os argumentos técnicos. As sanções são uma decisão política. Schäuble e companhia já decidiram que o atual governo deve cair ou governar sob um novo resgate que o obrigue a reverter as reversões. Não têm uma ideia de comum, mas uma cultura de desprezo e punição. Pensam que países como Portugal estão condenados a terem de ser controlados para não prejudicarem o euro e a UE. Mesmo as forças da “social-democracia europeia”, em que António Costa confiava, ou estão com estes falcões ou não têm dimensão (ou vontade) política para se lhes opor.
Estamos perante uma nova realidade que deve merecer uma resposta no plano nacional. Não bastará o recurso aos tribunais europeus ou um patriotismo folclórico entre bandeiras à janela e comendas.
Tiago Mota Saraiva