Os nossos velhos

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Chamamos-lhes os “casos sociais” e logo aí devíamos parar para pensar. Casos sociais são os outros, não acontecem connosco. Até que um dia não temos alternativa. O hospital deu alta ao avô e não há para onde levá-lo, não há uma rede de cuidados continuados, e sabemos que ele ficaria melhor na nossa casa, pois não precisa de cuidados clínicos especializados. Queríamos acompanhá-lo, mas a nossa vida profissional não nos dá essa possibilidade. No início deste ano, dizem as fontes oficiais, havia 141 pessoas nestas condições nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde – ao longo do ano foram 842 e ficaram em média 23 dias no hospital, apesar de terem alta clínica. Este é um problema que vai crescer, porque a esperança de vida, que era de 63 anos em 1960, já ultrapassa os 80, e a idade de reforma vai subindo pouco a pouco. A boa notícia de vivermos mais não pode tornar-se um problema intransponível. A sociedade ainda não está adaptada a ter mais velhos, e mais doenças que retiram autonomia. Apesar de todas as dificuldades, há mais soluções preparadas para as crianças nestas circunstâncias. É mais fácil comovermo-nos perante uma criança a precisar de apoio imediato e de um projeto de futuro, e aliás está consagrado o direito a acompanhar os filhos quando estão doentes. Para os mais velhos, não tem sido avaliada a necessidade de criar alternativas. Por isso é tão importante que esteja em preparação uma série de medidas – uma parceria dos ministérios da Saúde e do Trabalho e Segurança Social, cooperação que deve ser sublinhada – para permitir aos cuidadores trabalhar a partir de casa ou ter redução de horário. Essas ou outras soluções, aliadas a um reforço dos serviços de apoio domiciliários, não são apenas reconfortantes, são indispensáveis e justas. E quem sabe se os nossos mais velhos, recuperados e enérgicos, não vão aparecer nas reportagens sobre caminhadas e outras atividades saudáveis um dia destes.

Ana Sousa Dias
Opinião DN 24.01.16