Clara Soares-Jornalista |
Da síndrome do coração partido até à saúde cardíaca, abundam evidências científicas sobre a relação entre as formas de sentir e o funcionamento desse músculo vital. Sincronizar é preciso
A vida muda num instante. Num dia normal.” Assim começa o livro de memórias da jornalista e escritora norte-americana Joan Didion, publicado em 2005. O marido sucumbira a um ataque cardíaco, uma semana após o internamento da filha adotiva do casal nos cuidados intensivos, que também viria a morrer. O Ano do Pensamento Mágico valeu-lhe inúmeros prémios e uma medalha pelo então Presidente dos EUA, Barack Obama. No livro, descreve, de forma contundente, o seu colapso físico e emocional, que a levou a renunciar à comida ao ponto de chegar a pesar 34 quilos. Desde então, muitos são os que se identificam com o relato de Didion e nele buscam conforto e apoio para superar a dor.Enfrentar o choque e a dor da perda encolhe-nos. Sabemo-lo pela voz de inúmeras figuras públicas, que encontraram na música, na escrita, na arte, formas de exorcizar fantasmas e superar traumas ou experiências de stresse agudo que as deixam, literalmente, “para morrer”, com o “coração desfeito”. Como se os afetos, ou objeto desses afetos, habitasse esse órgão e não estivesse na cabeça, a casa da razão. Só que não, demonstra-se no clássico O Erro de Descartes, do neurocientista António Damásio, e nas investigações que se seguiram: a sede das emoções está, afinal, no cérebro (sistema límbico).
“Há uma relação imediata entre a parte cardiovascular e as emoções”, esclarece o cardiologista Victor Gil, professor na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. “Em situações de stresse severo, há uma reação de alerta (no hipotálamo) e ativa-se o sistema nervoso simpático, que prepara o corpo para responder a ameaças.” A falta de ar e a dor no peito surgem após um susto grande, uma doença súbita, um acidente grave ou a morte de alguém. A frequência cardíaca e a pressão arterial aumentam, as pupilas ficam dilatadas e o fluxo sanguíneo é redistribuído para os músculos através da vasoconstrição (“Ficou branco, sem pinga de sangue”).