Pausa

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Uma estória de amor

Queria falar-te de amor. Queria dizer-te
as palavras exactas, transparentes,
feitas de sílabas húmidas, ou mais:
de acentos agudos como setas
inquietas
rompendo mar adentro do teu corpo.

Queria dar-te o trigo, dar-te o pão
que te matasse a fome devagar
e que nunca essa fome se saciasse. Queria
mais que tudo sempre apetecer-te
e nem teu nome eu sei pronunciar.

Chamar-te-ás Esperança ou Margarida
ou Rosa e sei lá eu de quantos cravos
nasceste aqui tão perto e já tão ferida
ou de quais amores traídos sempre limpa
saíste a reclamar-me em teus abraços.

Chamar-te-ás Aurora ou Liberdade
e não o mal-me-quer com que confundem
teu nome verdadeiro. Hás-de ser
amante de poetas e de operários
que erguem o futuro com as mãos
e escrevem ou esculpem nas calçadas
o rumo onde o futuro se aconchega

e tenhas tu o nome que tiveres
é de amor que te falo, de ternura
de cópolas gritadas nessa cama
onde se faz um filho por querer
que um filho seja o futuro que se ama.

Eu sei aonde estás. Sei que me queres.
E sei o mais de mim que a ti se oferece.
Sei que não me perdoas se disseres
que sou
mais um
a morrer na praia que merece.

Ai, meu amor de mim,
que bem que eu sei
que um amor assim sempre apetece!

NGS
Outubro. 2013