A JUSTIÇA HÍBRIDA QUE TEMOS

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A voz do pensamento e da razão, nunca deviam ser abafadas, contudo, a censura sem sensatez está a fazer o seu triunfante regresso ao nosso país, criando um lago sem ondulações, sob o qual, escabrosa escumalha sem senso, bolina ao sabor das suas ambiciosas conveniências, rilhando e triturando tudo o que lhe possa impedir o caminho para o seu duvidoso sucesso.

Assim, a justiça neste ambiente amniótico poluído de interesses, em que a ambição materialista constitui o pilar fundamental, é infeccionada por forte ambliopia em relação ao dever da imparcialidade; pode ser vesga, cega de um ôlho ou completamente cega, dependente das circunstâncias que alimentam as decisões, que na subjectividade que a contempla são edificadas.

Seja pelo pavor aos dominadores ou devido à inépcia ou fraqueza espiritual de quem analisa, bastantes vezes o mais certo é saírem os prevaricadores ilesos e materialmente compensados e os ultrajados “passados a ferro” e atirados para o cadafalso da incredibilidade.

Verifica-se que, em várias ocasiões, para aplicação de sanções coercivas emanadas de uma mesma lei, existem vários juízos com pontos de vista diferentes, estados de espírito diversos e índices de auto-protecção à impermeabilidade, também diferenciados; para quem não é mole do miolo, apercebe-se que neste campo, o relvado aparente da razão está minado por uma sujidade caciquista cuja influência exerce grande pressão na tomada consensual das decisões.

E é nesta atmosfera putrefacta que côncava também, além dos grandes centros urbanísticos, as cidades “rurais”, onde a inconstância fumega sobre os valores dos apadrinhamentos e compadrios que a apreciação se torna doente, fazendo com que, muitas vezes a “justiça” exponha o esqueleto cavernoso, cinzento e medonho da injustiça.

Não é propriamente a honra que comanda esta atmosfera, mas vingança – mácula incapacitante do bom senso – e a avidez materialista com o rumo virado enriquecimento fácil, a falta de carácter, ética e moral, depauperadas ou inexistentes e o recalcamento do intelecto daqueles que, apesar de terem tudo, não têm nada – nem miolos – têm vindo a subsidiar os elementos transformadores da nossa democracia numa ditadura de contornos Inquisitoriais ou Pombalinos, onde muitos inocentes são cozinhados no panelão da insensatez para bel-prazer de ramelosos srs. que se alcandoram de capos sem vergonha, a qual morreu à nascença.

Cheira-me a fumaça!

As fogueiras da Inquisição há muito que se apagaram, mas quer parecer-me que as cinzas ainda fumegam, atiçadas por abusos de, ou influências no poder, que injectam um enorme quinhão de hibridez na imparcialidade analítica, mas…

Infelizmente é a justiça híbrida que temos.

António Figueiredo e Silva
Coimbra, 22/12/2015