Aquilo que parecia ser a resolução de um problema, que afeta muitos portugueses, revelou-se um verdadeiro embuste. O ministro do Trabalho e Segurança Social chegou-se à frente. A intenção manifestada por Vieira da Silva fazia acreditar que os portugueses, os das longas carreiras contributivas, deixariam de ser penalizados no caso de pedirem a antecipação da reforma.
E o ministro não mentiu. Os portugueses com longas carreiras contributivas vão deixar de sofrer penalizações na antecipação da aposentação. É verdade. E, afinal, de que falamos quando falamos de uma longa carreira contributiva? Falamos de alguém que tem, pelo menos, 48 anos de descontos para a Segurança Social e 60 anos de idade. É a pura verdade, embora pareça ficção. Uma verdadeira miragem: apenas os que começaram a trabalhar aos 12 anos a podem alcançar. E serão muitos os portugueses que, no ano de 1969, com 12 anos, ingressaram no mercado de trabalho em vez de continuarem nos bancos da escola, a jogar à bola na rua, ou, no caso delas, a brincar com bonecas ainda que fossem de trapos.
O ministro Vieira da Silva, um homem que tenho por sério, com esta medida não fez mais que fingir a resolução de um problema a preocupar muitos dos nossos cidadãos. Embora a trabalhar há muitos anos, não atingiram ainda a idade legal de reforma, que a cada revisão do fator de sustentabilidade se afasta mais de cada um de nós. Para muitos, cujos ordenados nunca foram abonados, a penalização é quase a porta aberta para a indigência. O ministro resolveu o problema, mas esqueceu um pormenor – e esse pormenor faz toda a diferença.
No final da década de 60 do século passado, quando um pai decidia pôr uma criança a trabalhar, exigir do patrão descontos para a Segurança Social não estaria nas suas prioridades. Era menos uma boca a alimentar e que trazia algum para o modesto rendimento familiar. E o patrão, enfim, o patrão seria a pessoa a quem se agradecia a graça, jamais exigir contrapartidas ao senhor. Afinal, a criança tinha a sorte de encontrar alguém capaz de lhe ensinar uma arte, em vez de andar a malandrar. Estudos era coisa de elite, as prestações sociais um conceito praticamente desconhecido dos portugueses. Vieira da Silva sabe melhor que ninguém que o acesso à saúde e ao apoio na terceira idade nem sequer entrava no sonho da maioria dos nossos trabalhadores. Foi bondosa a intenção do ministro, mas não passa esse patamar de bondade imaterial: o número de abrangidos será praticamente residual. Faz lembrar o jocoso letreiro que algumas mercearias antigas exibiam: “só se fia a maiores de 95 anos, acompanhados pelos seus pais”.
Paula Ferreira