Défice democrático

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Os gregos estão, mais uma vez, a alumiar o caminho. As finanças serão importantes, mas a convergência europeia não se fez para fazer o euro. Fez-se para a convergência dos povos e para evitar guerras. A Europa é o continente mais mortífero da Terra – aqui se desencadearam as guerras mais atrozes da humanidade, num rol interminável de atrocidades.

Mas a construção da União Europeia foi um processo não democrático, em que políticos não eleitos e burocratas acéfalos impuseram a sua vontade a 500 milhões de almas que se deixaram subjugar. O referendo deste domingo devolve o poder ao povo. Votem sim ou votem não, mas escolham por si o caminho que querem (e, em qualquer dos casos, o futuro não será fácil).

As negociações entre o governo grego, as instituições europeias, os credores e o FMI foram uma alegre trapalhada e um sinistro jogo de sombras. Mas o destino de um povo não se negoceia, escolhe-se. E os gregos têm agora a oportunidade de optar pelo caminho que mais lhes convier, num límpido exercício de soberania popular. É bom que isto sirva de exemplo aos restantes europeus, também manietados por tratados que desconhecem e políticos que os desrespeitam. Não é por acaso que o Sul da Europa está cada vez mais com a esquerda radical e o Norte com a direita xenófoba.

É porque os partidos do centro desbaratam a confiança dos seus eleitores e permitiram a construção de uma União Europeia que não é eleita por ninguém e se deixou prender por interesses económicos e financeiros que não servem os povos. O défice europeu é, muito antes de orçamental ou financeiro, um défice democrático. A Europa não tem futuro enquanto não a devolverem aos europeus.

José Diogo Madeira

Opinião Jornal i 04.07.2015