Estamos sob ataque

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É uma nuvem ameaçadora aquela que paira hoje sobre as democracias ocidentais. Depois de Trump e da interferência russa, ainda sob investigação, mas que é clara no que respeita ao saque a que foram sujeitos os emails da candidatura democrata, anunciava-se que algo semelhante poderia suceder com as eleições francesas. O ataque informático à candidatura de Emmanuel Macron acabou por suceder, mas na sexta-feira antes da data do sufrágio e sem resultados evidentes.

Por um lado, porque a própria candidatura tomou precauções e espalhou documentos falsos entre os ficheiros roubados; por outro lado, porque o período de reflexão – tantas vezes escarnecido entre nós – impediu legalmente os jornais de publicar matérias que pudessem influenciar o resultado eleitoral. Mas quer isto dizer que a nuvem se dissipou?

Uma investigação jornalística do jornal “The Guardian” tem vindo a revelar uma teia de ligações que mostram que ela continua ameaçadora, capaz de influenciar as nossas democracias. No centro desta teia está Robert Mercer, um multimilionário de Silicon Valley dono de um dos fundos de investimento mais lucrativos do planeta e que sozinho apoiou Trump com 13,5 milhões de dólares. Mas a sua principal arma é uma empresa chamada Cambridge Analytica, capaz de reunir e analisar gigantescos volumes de dados e com eles desenhar estratégias para influenciar eleitores. A nossa pegada digital é um manancial de informações que facilmente pode ser utilizado para influenciar a maneira como vemos o Mundo, nomeadamente através do que nos é servido na Internet, nas nossas buscas ou no Facebook, por exemplo.

Esta empresa, ou alguma das suas sucursais, trabalhou para a campanha de Trump e para a campanha do Leave e se acrescentarmos que Robert Mercer é amigo de Nigel Farage, que o conselheiro de Trump Steve Bannon foi vice-presidente da Cambridge Analytica e que esta empresa opera intensamente com empresas estatais russas e mesmo nas eleições deste país, a teia começa a revelar a sua forma ameaçadora.

A revista “The Economist” classificava esta semana os dados informáticos como “o mais valioso recurso do Mundo”, apelando às autoridades que se modernizassem para enfrentar os desafios para a economia que elas representam. Mas, como mostra o caso da Cambridge Analytica, temos de ir mais longe, com novas regras para a proteção e manipulação de dados, porque mesmo que não vejamos, que mal percebamos, é a democracia que está sob ataque.

David Pontes
Opinião JN 12.05.2017
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