O recém-criado Instituto de Proteção e Assistência na Doença, IP, iniciou um procedimento de eleição direta de quatro dos seus beneficiários para o seu órgão de acompanhamento, controlo, consulta, o Conselho Geral e de Supervisão, procedimento este que se está a desenvolver em moldes que desvirtuam o espírito e a letra da lei que o estabeleceu. Basicamente, em lugar de candidaturas individuais dos beneficiários, este procedimento foi sendo alterado, apontando agora para a eleição de listas de quatro efetivos e quatro suplentes, duplicando o mecanismo de representação previsto na lei, de nomeação de três representantes indicados pelas organizações sindicais e dois pelas associações dos reformados e aposentados.
A questão é importante porque o instituto em causa, criado por transformação da antiga Direção-Geral da ADSE, é certamente uma das entidades de maior dimensão humana e impacte na economia da saúde: tinha em finais de 2015 cerca de 1 milhão e 250 mil beneficiários, entre servidores da Administração Pública central e regional e local, seus familiares e aposentados. Estes beneficiários pagaram naquele ano, através das suas quotizações, a quase totalidade da receita da ADSE, cerca de 601 milhões de euros, a qual, deduzida de encargos ligeiros de administração (8,1 milhões de euros) suportou 480,6 milhões de euros de encargos de saúde com os seus beneficiários, deixando assim um superavit muito considerável.
Embora a situação pareça confortável no plano económico e financeiro, estão identificados riscos significativos a prazo de 7/8 anos, determinados no essencial pela paragem na admissão automática de novos beneficiários, com o consequente envelhecimento dos atuais e crescimento das despesas de saúde num conjunto remanescente cada vez mais idoso. Riscos que já conduziram o atual presidente do Conselho Diretivo a produzir declarações sobre a necessidade de vir a aumentar as quotizações dos beneficiários – hoje iguais a 3,5% da remuneração bruta atingindo valores superiores aos prémios de muitos seguros de saúde – bem como sobre a criação de uma conta de capitação dos encargos por beneficiário, que evoluiria para a sua limitação.
Estas, a par de outras questões imediatas e/ou de curto prazo, apontam para a necessidade de valorizar o princípio da gestão participada estabelecido no corpo da lei que criou o instituto, através da participação dos beneficiários na sua governação, ao nível das decisões estratégicas e de controlo financeiro, participação essa que não deve ser distorcida através da duplicação da representação das entidades que o Governo nomeia para o dito Conselho Geral e de Supervisão.
A nosso ver, só a apresentação de candidaturas individuais de beneficiários em pleno gozo dos seus direitos, independentemente dos seus vínculos a associações sindicais ou de aposentados/reformados selecionados para a nomeação referida, poderá sanear a situação.
Porém, a não vingar esta perspetiva, é então absolutamente inaceitável que as listas a apresentar para sufrágio direto e universal dos beneficiários, com quatro efetivos e quatro suplentes, seja meramente identificada por uma letra atribuída por sorteio e como tal votada! Aliás, esta fórmula contrasta com a exigência, legítima, de que em relação a cada lista proposta conste:
- A identificação completa dos membros das listas;
- O curriculum e referências profissionais dos membros das listas;
- O manifesto eleitoral da candidatura;
- As declarações de interesses dos membros das listas.
Rosário Gama e Crisóstomo Teixeira
Associados APRe!
JN opinião 15.05.2017