O manto diáfano do emprego

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Como se qualifica um modelo assente em baixos salários, precariedade e reduzida proteção ao desemprego?

O país tem assistido com alívio à descida da taxa de desemprego, que se cifrou em 11,9% no segundo trimestre de 2015, quando há doze meses estava em 13,9% e em 2013 tinha batido nos 16,2%. A maioria tem assinalado com entusiasmo esta tendência, enquanto a oposição a tenta desvalorizar, sustentando que entre desencorajados, pessoas que emigraram e milhares de outras que estão a frequentar cursos de formação, a verdadeira taxa de desemprego é bem superior. Não foi, contudo, este Governo que definiu as regras como se mede o desemprego. Por isso, há que aceitá-las e olhá-las à lupa para compreender que tipo de emprego está a ser criado e qual o modelo que está a emergir em Portugal após quatro anos de austeridade.
Ora recorrendo à Pordata constata-se que desde o início do século a população empregada reduziu-se em quase 600 mil pessoas (591,8 mil). Com efeito, enquanto em 2000, havia mais de 5 milhões de pessoas empregadas (5.041,3 milhares), atualmente esse número caiu para 4.449,5 milhares. A diminuição fez-se sobretudo sentir nas pessoas empregadas a tempo inteiro (menos 576,7 mil, fixando-se agora em 3.910,8 milhares), ganhando peso as pessoas empregadas a tempo parcial (mais 34,9 mil, atingindo 588,7 mil).
Olhando depois para os trabalhadores abrangidos pela retribuição mínima mensal garantida (505 euros desde novembro de 2014), constata-se que quase 20% se encontram nesta situação, o que é verdadeiramente surpreendente pois em abril de 2014 esta percentagem era de 13,2% e pulou em seis meses para 19,6% (!), quando entre 2011 e 2013 oscilou entre 11,3% e 12% (boletim do Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério de Economia).
Se olharmos entretanto para a remuneração média para o conjunto da população empregada constata-se que ela é atualmente inferior em 24,5 euros (971,5 euros em outubro de 2011, 947 euros em outubro de 2014). Outro dado interessante tem a ver com o facto de das 620,4 mil pessoas desempregadas no segundo trimestre de 2015, apenas 268.141 (43,2%) estarem a beneficiar do subsídio de desemprego ou de outro tipo de apoio social — o que quer dizer que mais de 352 mil pessoas (56,8%!) desempregadas não recebem qualquer apoio público.
Conclusão: a economia está a criar mais emprego. Mas esse emprego é mais precário e muito barato, enquanto diminuem os apoios públicos aos desempregados. Ora como se qualifica um modelo económico assente em baixos salários, precariedade e reduzida proteção ao desemprego? Vêm-me vários nomes à cabeça e nenhum deles cola com uma economia moderna, dinâmica e inovadora. E não é por falta de formação: em 2013 houve 17.339 empresas que realizaram ações de formação com a duração média de 33 horas, envolvendo 854.394 trabalhadores (!) e com o custo por trabalhador de 354 euros. Pode não ter resultado. Mas foi um grande negócio.
Nicolau Santos
Opinião Expresso 29.08.2015