Em 2012, os nomes de 2.059 gregos terminaram estampados na imprensa, numa espécie de “lista informal de devedores ao fisco” muito mais interessante, em valores e em protagonistas VIP, do que as tradicionais listas de contribuintes como as que o Fisco português publica regularmente
Qualquer caso ligado a offshores começa sempre com grande estrondo, faz correr rios de tinta durante uns quantos dias e desaparece, logo a seguir, quando embate em uma de duas barreiras: sigilo fiscal ou segredo de Justiça. E, curiosamente, nestes casos, o segredo de Justiça funciona mesmo em Portugal, não há escutas reveladas à socapa ou processos filtrados para nenhuma redação ou até se desconhece se há sequer suspeitos. Nada. Pacto de silêncio, absoluto. Talvez todas as operações sejam classificadas como legais, talvez terminem num acordo extrajudicial ou, o mais provável, numa gaveta para quando derem jeito.
Os dez mil milhões de euros enviados para centros offshores, entre 2011 e 2014, e omitidos das estatísticas, são só o caso mais recente. As bancadas políticas agitam-se, comissões parlamentares chamam responsáveis, promessas de nova legislação e supervisão mais apertada são feitas, num déjà vu parecido ao que aconteceu com outro caso de suposta fuga e evasão fiscal, a Lista Lagarde. E onde pára a Lista Lagarde? A lista – extraída do caso Swissleaks, com mais de cem mil nomes suspeitos de evasão fiscal com conta no banco suíço HSBC – andou alegadamente perdida entre dois governos, um do PS, outro do PSD/CDS. Parece que só chegou a Portugal em 2015, às mãos do antigo Secretário dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, cinco anos depois de ter sido entregue, por exemplo, às autoridades gregas. Pelo meio, por coincidência, houve duas amnistias fiscais (RERT) – da qual só se soube o nome de um dos beneficiários, Ricardo Salgado.
Na Grécia, a Lista Lagarde também se perdeu durante uns tempos. Um ministro das Finanças grego chegou mesmo a ir a tribunal por, supostamente, ter subtraído uns nomes de familiares que constavam na lista. Foi ilibado. Mas, em 2012, os nomes de 2.059 gregos terminaram estampados na imprensa, numa espécie de “lista informal de devedores ao fisco” muito mais interessante, em valores e em protagonistas VIP, do que as tradicionais listas de contribuintes como a que o Fisco português publica e atualiza regularmente.
Em Portugal, nem se sabe quantos nomes estavam na Lista Lagarde. Núncio pode dar algumas pistas sobre este dossier, assim como explicar o eclipse das estatísticas dos dez mil milhões durante o seu consulado. E Sérgio Vasques, seu antecessor no cargo, também pode ser útil para se perceber onde andou a Lista Lagarde que lhe devia ter sido entregue em 2010. As consequências da falta de memória ou de inércia têm de ser mais graves que um ‘puxão’ de orelhas político numa comissão parlamentar. E os resultados das investigações têm limites temporais para o refúgio do “sigilo fiscal” ou “segredo de Justiça”.