Para que existe a União Europeia?

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Os cidadãos da União Europeia (UE) têm diferentes ideias e aspirações sobre esta:

– Após séculos de guerras fratricidas entre as potências europeias, para alguns – decisores políticos visionários que estão na génese da sua criação, sobretudo nos países da Europa central – as Comunidades Europeias (que mais tarde foram incorporadas na UE) eram uma forma de evitar esses conflitos bélicos;

– Muitos reconheciam que os Estados Nação da Europa eram demasiado pequenos e que existia a necessidade de alguma coordenação e planeamento conjunto a nível europeu para evitar demasiado investimento (e proteccionismo) em indústrias nacionais, que dessa forma nunca atingiriam a dimensão nem a eficiência necessárias. Na génese da UE encontram-se os acordos realizados relativamente à produção de carvão, aço[1] e mais tarde produção agrícola;

– Outros ainda, em que se incluem muitos portugueses, mas também espanhóis e gregos, encaravam a UE como a referência de desenvolvimento económico e social a alcançar, para sair definitivamente do subdesenvolvimento que caracterizava os respectivos países há décadas e para afugentar os fantasmas da ditadura, evitando a perspectiva de golpes militares, consolidando a liberdade de opinião e aprofundando a democracia;

– Provavelmente para os cidadãos e decisores de países da Europa do leste, a EU representaria, para além do bem-estar material e social acima referido, a liberdade de opinião e de circulação que não existia na União Soviética, bem como uma garantia de que os tempos da União Soviética dominada pela Rússia não regressariam.

E haverá certamente outras visões e aspirações dos cidadãos da Europa sobre a UE.

Cabe pois questionar o desempenho da UE face a estas visões e aspirações:

No que à economia respeita, para demasiados cidadãos da Europa, após um período de euforia e desenvolvimento económico, o desempenho, nas primeiras décadas do séc. XXI, tem sido decepcionante. Baixas taxas de crescimento económico e elevadas taxas de desemprego, sobretudo jovem, particularmente nos países do sul da Europa, corroem a esperança, a sociedade e a democracia. Países sobre resgate e vários outros em dificuldades financeiras –, cidadãos em situações de pobreza e exclusão.

Iniciativas de política económica recentes da UE com o objectivo de promover o crescimento económico numa Europa à beira da deflação e com grandes assimetrias entre o norte e o sul – veja-se, por exemplo, o “plano Draghi” e o “plano Juncker” – mesmo merecendo o benefício da dúvida quanto às suas potencialidades, têm sido sempre de difícil e morosa aprovação, vêm sempre cheios de “se”s e demoram muito tempo a passar do papel para o terreno. O plano Draghi não mereceu o apoio do governo alemão e foi precedido de vários “programas intercalares” antes de finalmente se poder passar ao programa de compras de dívida pública. O plano Juncker começou a ser discutido em 2014 e espera-se que seja aprovado no final de 2015, para ser implementado entre 2015 e 2017.

Os planos económicos definidos pelas instituições de governo da União Europeia ganharam em dimensão e relevância é certo, mas tornou-se progressivamente mais difícil iniciar ou alterar políticas económicas.

Mas, quando se trata de assumir (e centralizar) novos poderes a União Europeia tem sido muito mais expedita. A título de exemplos mais recentes: o Tratado Orçamental e a União Bancária (sobretudo a centralização da supervisão e da resolução bancária).

Em relação à democracia, é reconhecido por muitos a falta de legitimidade democrática de algumas das instituições de governo da União Europeia.

Deste modo, dois importantes planos – a democracia e a economia – duas legítimas aspirações sobre a União Europeia não estão a ser cumpridas, estando os seus desígnios a falhar perante uma parte muito significativa dos seus cidadãos.

Não é aceitável que seja assim. O futuro da União estará em dúvida se esta não for capaz de se reinventar, corrigindo o seu modus operandi e sobretudo, através de políticas económicas adequadas, assegurar uma vida melhor à generalidade dos seus cidadãos.

[1] Em parte, na origem das guerras do século XX e nos respectivos acordos de paz estava a luta pelo controlo destas matérias primas. Veja-se, por exemplo, um episódio da história da região do Sarre.

Ricardo Cabral
http://blogues.publico.pt/tudomenoseconomia/ 07.04.2015