Os números oscilam de país para país, mas têm um denominador comum: é nas camadas mais jovens que a taxa de abstenção atinge valores mais elevados. Nos Estados Unidos, os níveis de participação em eleições presidenciais variaram, desde 1980, entre 48% e 59%. Mas na faixa dos 18 aos 29 anos chegaram a baixar a cerca de 32%.
Num ano de escolhas relevantes para a Europa, em França, Alemanha e Holanda, é tempo de olhar com outro entusiasmo para o ato eleitoral. Quem não vai às urnas sente que o seu voto não irá mudar nada. Ou que nenhuma das opções em apreciação vale a sua escolha. Ou, em último caso, que os políticos são todos iguais.
Os chavões só nos distanciam cada vez mais de uma intervenção cívica que não é apenas um direito, mas um dever. Os vícios de quem ocupa o poder são incontáveis e as razões para a desconfiança mais do que muitas. E o sistema afigura-se de tal modo enferrujado que vale a pena, a todo o momento, fiscalizar e procurar melhores formas de expressão democrática. Mas a verdade é que os políticos não são todos iguais. E cada vez que ficamos parados em casa, em dia de eleições, contribuímos para legitimar as escolhas de quem vai votar. Que outros decidam por nós.
Donald Trump está apenas a começar o seu mandato mas já deixou bem claro que é um político que cumpre. Se alguém está surpreendido com medidas como o decreto anti-imigração, só pode ter estado desatento durante a campanha eleitoral. Mas é provável que se a geração mais jovem, aquela em que Trump teve a taxa de aceitação mais baixa, tivesse saído mais de casa para votar, os resultados pudessem ter sido outros.
Estamos a falar de uma geração particularmente ativa nas redes. Que se manifesta ao segundo, domina as tecnologias e a ação digital. Uma geração que deve questionar-se sobre o papel que quer ter na comunidade. Um “gosto” não muda o Mundo. E esse é um erro que todos, em qualquer idade, estamos a cometer. Comovemo-nos muito, protestamos, partilhamos vídeos virais, mas tiramos muito pouco o rabo da cadeira.
Marine Le Pen, a líder da extrema-direita que aspira vencer as presidenciais e tem bandeiras eleitorais como reduzir a imigração a dez mil pessoas por ano ou introduzir a prisão perpétua, disse esperar que este ano a Europa acorde. Eu também, embora a minha noção de despertar seja outra. Que a Europa mostre, nas urnas, que escolhe a coesão, a tolerância e a entreajuda como caminhos para o futuro. Para muros, já temos um Trump de sobra.
Inês Cardoso
JN 06.02.2017
Leia mais: Tirar o rabo da cadeira