A 15 de setembro os portugueses manifestaram-se contra as alterações à Taxa Social Única (TSU). Tratava-se, na proposta do governo, de retirar aos trabalhadores para dar aos patrões. Num momento em que os portugueses sentiam na pele a austeridade, aquela medida criou um sentimento de injustiça. Mas não era mais do que a oficialização da estratégia do governo e da troika que se resumia numa frase mal compreendida: para sair da crise teremos de empobrecer.
O tema volta agora e volta no mesmíssimo sentido: a estratégia para a economia portuguesa desenhada pela Europa para Portugal (e também para a Grécia, cuja recusa pode significar a sua expulsão do euro) passa por reduzir significativamente os custos em trabalho. Sejam os custos salariais sejam os custos que garantem o rendimento que chega a quem trabalha por via das pensões e dos apoios sociais. Quando um patrão vê a TSU reduzida está a diminuir o salário indireto dos trabalhadores. O trabalhador não o sente agora, mas senti-lo-à quando se reformar.
Na proposta de 2012 havia uma transferência do financiamento do empregador para o trabalhador. Na proposta que agora surge há uma transferência do empregador para o beneficiário, já que com esta redução de financiamento se acelera a insustentabilidade da segurança social. A descida da TSU para os empregadores, mas não para os trabalhadores, altera duas vezes a forma como distribuímos a riqueza. Porque aumenta, no conjunto do financiamento, a proporção que está a cargo do trabalhador e porque garante que terão de ser feitos novos cortes nas pensões.
A 15 de setembro de 2012, a TSU não foi a razão para as manifestações. Foi a gota de água. Porque a TSU denunciava de forma muito clara a estratégia de empobrecimento dos trabalhadores e da classe média que a troika e o Governo defendiam para tornar o país competitivo. E denunciava de forma clara a injustiça de um “ajustamento” que, na realidade, faz parte da contrarreforma, que quer e está a mudar radicalmente a forma como distribuímos a riqueza entre trabalho e capital. Uma contrarreforma a que assistimos na Europa e que foi, porque há condições políticas para que seja, acelerada nos países que vivem dificuldades financeiras mais agudas.
Isto apesar de, como salta à vista, estas mudanças na TSU terem como principal consequência criar mais problemas financeiros ao Estado. Mas não é, nunca foi, isso que esteve em causa na agenda que domina a Europa. O que está em causa é a imposição de um novo modelo social defendido por uma corrente política minoritária que conseguiu, através da captura das instituições europeias e do isolamento de todos os focos de resistência, impor a sua vontade contra a democracia.
O regresso da TSU não me espanta. A razão pela qual as brutais manifestações de 15 de setembro não tiveram consequências – a TSU foi substituída por outras formas de perda de rendimento dos trabalhadores e o Governo ficou no seu lugar – foi a inexistência de alternativa política. As pessoas acabaram por desmobilizar e o sentimento de frustração passou a dominar, nos dois anos e meio seguintes, a política nacional. Em vésperas de eleições, isso não mudou. Mesmo sendo altamente improvável que Pedro Passos Coelho venha a ser o próximo primeiro-ministro, a verdade é que ele conta com este sentimento de desânimo. O caminho que as coisas estão a levar na Grécia pode dar-lhe uma nova ajuda.