Uma democracia a sério

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A Islândia foi confrontada, em 2008, com o mesmo problema de dezenas de outros países atingidos pela crise financeira: salvar ou não os seus bancos? Uma economia que valia 10 mil milhões de euros teria de resgatar dívidas seis vezes superiores, que se encontravam no balanço dos seus três grandes bancos falidos. Contra todas as pressões e ameaças, os governos da Islândia, de todas as cores políticas, preferiram deixar afundar os bancos e salvar as pessoas e a economia real que as sustenta.

As reclamações de fundos britânicos e holandeses prosseguem nos tribunais, mas em referendo os islandeses disseram “não”, e o primeiro-ministro Gunnlaugsson explica, com candura, que a dívida dos bancos “não é dívida pública, e nunca o será”. Recusando totalmente a austeridade, a Islândia atravessou a tempestade. Em dois anos perdeu 8% do PIB e viu o desemprego subir até 11,9%. Mas, em 2011 começou a colher os frutos de ter confiado no seu povo. A desvalorização da coroa ajudou à explosão do turismo (cresce anualmente a 20%), as exportações de bacalhau e alumínio prosseguem em ascensão. Os islandeses reaprenderam a frugalidade (que é a austeridade voluntária da decisão ética, e não a pobreza imposta pela troika), mas apostaram mais do que nunca na defesa do seu Estado social, que em 2014 absorveu 43% da despesa pública.

O desemprego está nos 4% (contra 12,1% na zona euro),e em breve baixará para 2%.A taxa de crescimento é de 2,7%, bem acima da média da OCDE (2,3%). Alguém se admira que uma nação vigorosa tenha desistido de integrar essa balbúrdia em que se transformou a UE? A nossa fatigada Europa esqueceu a voz do cidadão, e parece já não atrair ninguém. Nem os relojoeiros suíços nem os pescadores islandeses. Apenas mete medo. Muito medo.

Viriato Seromenho-Marques
Opinião DN 14.03.2015