Verdades dolorosas

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A UE, esperança de várias gerações, já não parece ter conserto possível. Entre 2009 e 2014, a crise europeia concentrou-se na resposta errada, imposta por Berlim, à crise do euro, que, muito embora tivesse raiz imediata no desastre de um sistema bancário deixado em roda livre, foi erradamente denominada como “crise das dívidas soberanas”. Não só a crise do euro continua sem solução (disfarçada, embora, pelos analgésicos monetários do BCE) como a esta se juntaram uma série de outras crises, numa combinação explosiva. Para além do afastamento progressivo da Europa oriental, magnetizada pelo tradicional polo de atração russo (Polónia e Hungria), a Alemanha foi devastada política e moralmente pela crise de refugiados. Ela foi intensificada pela destruição da Líbia (2011) e da Síria (depois de 2012), incentivadas por Paris e Londres, que agora assobiam para o lado. Os refugiados não só colocaram Merkel na defensiva dentro de portas como distraem de um buraco negro financeiro, chamado Deutsche Bank (DB), evidenciado pela recente e brutal desvalorização da banca europeia. Em 2014, a Bloomberg quantificava a exposição do DB a produtos derivados em 64 biliões de dólares (o que equivale ao valor astronómico de cinco vezes o PIB da zona euro!). Resta ainda o risco de brexit para transformar a Europa na maior bomba-relógio do sistema internacional. Perante isto, a política doméstica parece assustadoramente trivial. A direita aposta no regresso ao governo, impelida por um novo resgate, repetindo 2011. A esquerda faz governação de cabotagem, esperando um milagre altamente improvável. Contudo, só os países que prepararem cenários de emergência com uma firme estratégia de coesão nacional terão menos danos e mais recursos para se reerguerem. Quando e se o pior ocorrer.

Viriato Seromenho-Marques
Opinião DN 05.03.2016